segunda-feira, 23 de julho de 2012

Para a chuva


“- Acorda amor... Você não deixou as roupas dependuradas no varal?”
Mas eis que começou uma chuva lá fora. Chuva frontal. Encontro de uma massa de ar frio com uma massa de ar quente do calor que se fez a semana toda.  Não chovia há semanas e a estiagem castigava. Castigava minhas noites mal dormidas nas quais eu ficava inquieto na cama consequente do calor infernal que fazia. Castigava meu cachorro que se esparramava no piso do banheiro em busca do local mais fresco da casa. Castigava minha mulher que reclamava dos ruídos provenientes do ventilador antiquado.  Mas nesta manhã de domingo, ela deu seu s ares por aqui.
 “- Quer saber meu amor, danem-se as roupas no varal, já estava sentindo saudades de uma pestana que valesse a pena, quando levantarmos a gente pendura atrás da geladeira.” Ela aprovou num monossílabo. Abracei-a fazendo nos onipotentes e adormecemos novamente. 
                Singelo canto da ave. Mais belo que o lendário assovio do uirapuru, que num voo repentino deixou de dar o ar de sua graça. Zarpou daquela arvore ao perceber que a chuva viria para dar espaço a outro espetáculo soberbo. Pessoas corriam dela, a não ser eu. E elas fugiam tal como a caça foge do caçador.  Mas ali eu permaneci. Banhado por aquela agua viva que a Terra saciava-se naquele momento. Enquanto a chuva caia em minha face, eu percebi que uma gota não era simplesmente um décimo de milímetro de agua que embebiam meu semblante de satisfação. Cada gota era uma gamela que já foi preenchida para saciar a sede. Cada gota era parte de um gigantesco regador que nutre solos e plantações. Cada gota é uma lágrima derramada por quem ela faz tanta falta. Cada gota é a inspiração de amantes e poetas do noturno e do soturno.  Cada gota é parte de um cenário de 1000 beijos apaixonados. Cada gota já esteve em mais lugares em que eu estarei em toda a minha vida.  Mantive meus olhos cerrados. Enquanto meu corpo e meus pensamentos eram sendo purificados em sua totalidade por uma das mais belas sinfonias criadas pela natureza. O som da chuva. 
                Despertei-me sozinho. A chuva cessara. O olor de café passado pairava pelo lar. Levantei-me e servi-me de uma xicara de café. Direcionei-me até a varanda e fiz-me o protagonista principal de um dos momentos mais pitorescos de minha vida. Sorvei um bom gole de café, envolvi a mulher que me foi destinada em meus braços, apreciando o arco celeste emoldurado em um vespertino em sépia.

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