Ele fazia parte de um grupo de
pessoas das quais eu, particularmente, mais desprezo na maioria das vezes. Se
auto-intitulava "Cult" (aqui, entre aspas gigantes, é óbvio que não
tenho nada contra pessoas com cultura, muito pelo contrário). Odiava conversas
curtas com certos palavrões, para ele só valiam à pena conversas longas com um
vasto repertório de palavras que talvez nem o Tio Aurélio pudesse desvendar. Odiava
bandas do momento, com acordes simples, aquelas que tocavam na rádio ou até
mesmo na MTV, para ele só tinham valor aquelas bandas que nem o Wikipédia e o
Google conheciam. Isso quando não apelava para clássicos como Beethoven ou
Mozart, só para "causar". Odiava filmes do momento. Blockbuster?
Tinha nojo de todos. Só era realmente bom aquele filme francês de 1987, ainda
inédito do Brasil. Ou aquele filme estrangeiro que não ganhou o Oscar de 1998 e
adivinha? Inédito no Brasil. Livros? Quem não lia 8 livros por semana e
distribuísse 30 horas em 7 dias para conversar sobre as obras eram indignos de
qualquer troca de palavras. Super heróis? Coisa para criança. Futebol? Coisa de
brasileiro ignorante. Qualquer time, liga ou religião? Atestado de burrice. E
assim ele cresceu, colecionou alguns namoros e vários preconceitos. Não lembro
se chegou a casar ou ter filhos. Tenho só uma certeza, morreu como a pessoa
mais chata que eu já conheci. Entediante, chatíssima, alérgica a diversão.
Viveu uma vida inteira se dedicando ao “Cult”, desprezando quem não fizesse
parte disso que esqueceu que é necessário, em pequenas doses, de um pouco de
besteira, do tosco, do blockbuster, até do superficial, da cerveja no bar com
amigos falando sobre bundas e peitos, das risadas ao som daquela banda do
momento ao invés daquela conhecida apenas por ele num raio de 150 km. Esqueceu
da essência do ser humano, ser tosco. Tosco o suficiente para se livrar dessa
robótica “Cult” e marcar efetivamente a vida de pelo menos algumas pessoas na
sua passagem pelo mundo. Morreu sozinho, demasiado chato, talvez indigno de um
epitáfio, mas quem se importa? Ao menos morreu “Cult”, conhecendo aquela banda
de Beirute, Líbano e tendo assistido aquele filme rodado em Bagdá, capital do
Iraque, aquele lá... ainda inédito no Brasil.
Por Vinícius Rodrigues
Por Vinícius Rodrigues
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