domingo, 23 de setembro de 2012

Madame Bovary



Não esperava.
Não queria.
Mas voltei, voltei sim.
Um vira latas desprovido de culpas.

Sexta feira de tarde, café da faculdade, mesmo local que havíamos nos conhecido meses antes.  Sabe aquele lugar com cheiro de pão de queijo? Acredito que seja uma das poucas lembranças que levo de lá. Pão de queijo. Quente e fofo, aquele que te anima para qualquer manhã fria, aquele que joga pro alto feito bola de praia na mão de criança arteira. Mas, eu não estava procurando pão de queijo, queria ela naquela tarde, naquela noite, era minha batalha a ser conquistada, a batalha da guerra que só eu conhecia.
Tava lá, pra sair vitorioso. No auge da minha autoestima.
Procuro.
Absorta no seu cigarro, ela caminha com elegância na área externa do café.  Próximo daí, um grupo de calouros fala de vide-game e cerveja, eles viram, olham admirando aquela beleza. Bobos. Torcicolo de bunda. Ponto pra mim, meu dia de sorte. Linda, morena que sabe fumar é uma coisa linda. Traga e joga a fumaça só como mulher de verdade sabe fazer.
Sigo na sua direção, sem nenhuma careta, apenas com um sorriso no rosto. Mais nada, apenas desejando simpatia. Respiração controlada, nenhum lábio mordido. Olhar fixo. Eu não me importava com ela, era minha presa e eu não era vulnerável a ela.
Continuo caminhando na direção dela. O sinal do começo do vespertino toca. Estava arrependido de caminhar na direção dela, se eu soubesse como seria recebido teria corrido. Ela me viu, parou. Sabia onde ia terminar, como ia terminar. Ela me recebeu com um sorriso que poderia fazer qualquer um subir o Himalaia, nu, sem comida.
- Bom?
- Mais que bom, pensei que não te encontraria mais por aqui.
- Eu sempre apareço.
- Percebi, faz um tempo não é. Nem lembro mais do teu nome.
- Eu nem lembro se perguntei o teu.
- Não perguntou mesmo. Mentira. Perguntou sim.
- Então...
- Incrível, e tu nem chega aos pés do meu tipo ideal.
- E eu não sei disso?
- Só vem comigo, até a biblioteca. Preciso renovar esse livro.
Ela estende Madame Bovary. Eu faço uma cara de que desconheço.
- Emma Bovary c'est moi.
- Só me deixa pegar um café, madame.
Poucas lembranças, a tarde era chuvosa. Ótimo, essa chuva de São Leopoldo é uma droga. Parece ácida. Quente e suja. Me deixa mais sujo, imundo. Mas ela lava minha alma.
Cerveja. Entre cervejas e papos lisérgicos ela acendeu um cigarro. Reparei na hora o Zippo dela. Era cravejado Harley Davidson, um camafeu de metal dourado. Porra, uma coisa dessas precisa ser a prova de roubo, se eu tivesse um ia enrolar ele todo em fita durex, só isso ia salvar aquela belezinha dos dedos ligeiros que tu encontra no bar.
Voltando ao zippo ou aos lábios, a boca loca que fuma e alterna com a borda do copo de cerveja gelada numa tarde de sexta feira abafada. Outro ponto para mim, estávamos jogando. Jogando um jogo ótimo. Chamado sedução. Jogo simples, poucas regras. Convencer a pessoa a sua frente que você vale a pena para a noite.  Nós lá, rindo da mediocridade dos outros frequentadores do bar, tomando litros de polar e se perguntando quem faria aquela pergunta primeiro.
Quebrei todas as minhas regras naquela sexta feira, eu voltei e tive meu segundo romance com Madame Bovary. O nome não interessa, mas na agenda do meu celular agora tenho uma madame.  É um jogo de xadrez, e para aquele final de semana queria saber com quantas peças eu andava. Voltei para casa no domingo. Cansado. Farto.

Sozinho.
Da forma que deve ser e da forma que sempre foi.
Sozinho.

"Deus, eu sou capaz de coisas vergonhosas por uma boca feminina" - Mário Bortolotto


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